terça-feira, 8 de janeiro de 2008

VIRIATO DOS SANTOS, O SENHOR MEU PAI…






Fazia hoje 92 anos se estivesse entre nós, mas não suportou a malfadada doença prolongada e deixou-nos em 20 de Outubro de 1995, com 79 primaveras e muitas e muitas saudades…

Era um Pai à maneira, à antiga, com valores e princípios democráticos e solidários que soube transmitir aos descendentes (Ivone, Fernando e eu), mas, acima de tudo, pugnava que a integridade de carácter, a seriedade, a dedicação fossem, como é, felizmente, a marca da família. Aprendi muito com o meu pai, copiando as suas peculiares qualidades de democrata e de trabalhador, de lutar contra as adversidades, contra as injustiças, contra tudo que tente subjugar o mais fraco, o mais oprimido. Valeu a pena ter um pai assim!!!

Esteve ao serviço da Companhia Carris mais de 40 anos, como guarda-freio, no sector dos eléctricos e, entre outras acções de protesto contra o fascismo, participou activamente na greve da mala, movimento dos trabalhadores da Carris que recusaram receber o valor dos bilhetes aos passageiros e juntaram as suas malas de cobrança nas entradas das Estações das Amoreiras, Arco do Cego e Santo Amaro provocando a ira do ditador e a raiva da PIDE-Polícia Internacional e de Defesa do Estado, a Polícia Política, que perseguiu os lideres deste marcante e inédito acto contra o regime ditatorial.

Como qualquer ser humano também tinha as suas paixões, das quais destaco estas duas: o Fado e a Aeronáutica Militar.

Na primeira, como morador desde novo na Rua do Guarda-Mor (em pleno centro do Bairro Alto), granjeou amizades, conhecimentos e experiências fantásticas junto daqueles que também gostavam da canção nacional. Lembro-me de Venceslau de Oliveira, Francisco Radamanto, Alfredo Marceneiro, Henrique Rêgo, Silva Tavares, Berta Cardoso, Carlos Conde, Martinho da Assunção, Carvalhinho, João Bastos e outros tantos nomes ilustres que faziam parte do rol dos seus companheiros de percurso. O meu pai tinha uma monumental colecção de discos (daqueles de 78 rotações por minuto!…), assim como revistas, jornais, fotografias de um tempo que marcou uma época. Recordo que, por vezes, fazia em nossa casa para estes seus amigos sessões onde escutavam gravações inéditas e raras através do som límpido duma grafonola fabricada em Macau. Quando começavam a escutar os fados, o primeiro a sair para a rua era eu, pois da canção nacional nicles, era mais bola… Contudo, quando fui para África e ouvia no programa Hora da Saudade, emitido pela então Emissora Oficial, o trinar da guitarra, as vozes tristes, a choradeira, o lamento, enfim, lá sentia o aperto da nostalgia bem dentro de mim… Ai que saudades, ai, ai… Pese embora o bom dinheiro que lhe ofereciam para adquirir as suas preciosidades, nunca acedeu à venda de qualquer das suas gravações…

Quanto à Força Aérea, o meu pai desde bem cedo ganhou um encanto por tudo o que voava pela mão do homem. Coleccionou tudo o que se relacionasse com a aeronáutica militar: Ordens da Aeronáutica, revistas, jornais, donde recortava as notícias e fotos, procedendo à sua catalogação e identificação em volumes próprios. Tinha uma caligrafia espantosa. Acompanhava a carreira de qualquer aviador militar, escrevendo o seu currículo, com actualização constante quanto a promoções, locais de serviço, e, cada qual com a sua foto individual! Interessante que estes volumosos livros foram solicitados, por várias vezes, para exposições aeronáuticas. Depois da sua morte foram doados ao Museu da Força Aérea (Alverca). Uma curiosidade, bem curiosa, aliás: O meu pai nunca viajou de avião… Da montanha de amigos que tinha na Força Aérea recebeu algumas promessas no sentido de obter o baptismo de voo, mas...

FOTOS - A partir de cima. 1. Meu pai, em 1936 (Repare-se no emblema da Força Aérea, nada pequeno, na lapela, juntinho ao lenço. 2. Minha mãe, em 1934. 3. Em 1994. 4. Os meus pais no casamento da minha irmã (Ivone). São o par mais perto dos padrinhos da noiva (eu e Fernanda Dâmaso). 5. Em 29.6.1973, com a famelga… Meu pai está junto à sua mãe, minha avó, Maria Gameira dos Santos, seguem-se minha irmã, minha mulher (Maria Júlia) com o nosso filho ao colo (Rui), no dia do seu baptismo, eu e meu irmão (Fernando). À frente, as suas netas Carla e Cristina.

1 comentário:

Anónimo disse...

O avô que menos conheci (sem contar com a minha avó Ester), mas do qual tambem tenho saudades.
Obrigado pelas fotos e pela lembrança.

Rui Santos